terça-feira, novembro 29, 2005
No final, só importa o que você fez!
No final, só importa o que você fez!
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Na vida interpretamos muitos personagens, filho, pai, marido, amante, namorado. Fingimos ser muitas coisas, palhaço, burguês, herói, louco. Somos uma só pessoa e, apesar de vivermos uma só vida, temos muitas faces, apesar de sermos uma só pessoa. Mas os outros, como os outros nos vêem? Será que os outros vêem o que realmente somos, ou eles enxergam todos os personagens que interpretamos?
A imagem que os outros fazem de nós é uma grande questão, ou melhor, uma grande resposta para muitos problemas humanos. No fundo, acabamos nos tornando aquilo que os outros vêem em nós. Muitas pessoas procuram, a vida toda, encontrar em outra aquilo que elas não conseguem ver nelas mesmas, ou buscam descobrir quem elas são, o seu interior, amando outra pessoa. Como se a outra pessoa, o outro, pudesse mostrar o que elas são, mostrar o interior, iluminar. O que buscam é o público, atento, amoroso e paciente, que vai deixar que elas apareçam. No fundo, sempre buscamos nós mesmos.
Interpretamos diversos papéis para nós mesmos, temos muitas faces para nos agradar, vivemos a vida toda olhando para dentro, procurando algo, nos procurando. Quando nos apaixonamos queremos mostrar o quanto somos bons, sensuais, felizes, inteligentes. Quando amamos queremos apenas nos amar, a outra pessoa serve apenas para isso, para nos mostrar que somos o centro do nosso universo. Passamos a vida toda assim. Quando temos atos de abnegação, quando somos altruístas, apenas queremos ser lembrados, pois somos perecíveis. Sermos lembrados, é a única forma de continuarmos depois de mortos.
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No final, só importa o que você fez, e você será lembrado por algo que tenha feito, não por tudo que você fez ou que você foi. Vivemos para os outros, para que os outros se lembrem de nós. A solidão reside em não ter público, não em estar sozinho, pois sempre estamos sozinho, assim nascemos e assim, um dia, morreremos.
Não importa o que as pessoas sejam o que importa é o que elas façam, elas serão lembradas apenas por isso, pelo que elas fizeram. Então eu fico pensando que nós podemos amar ditadores sanguinários, desde que não nos lembremos das atrocidades e genocídios que eles cometeram.
Assim, Hitler e Stalin, são lembrados apenas como ditadores sanguinários, e ninguém se lembra de nada de bom que eles tenham feito, pois todas os inocentes que eles mataram, toda a dor que eles provocaram foi maior do que tudo de bom que por ventura fizeram. Da mesma forma, Getúlio Vargas é lembrado como nacionalista, pai dos pobres, um homem de visão progressista, mas ninguém se lembra que ele foi ditador por anos.
Quantas pessoas morreram por políticas implementadas por Getúlio Vargas, ou por F. D. Roosevelt, ou W. S. Churchill? Mas ninguém se lembra deles como genocidas.
Gandi, indubitavelmente, era um homem de paz, e assim sempre será lembrado, mas ninguém se importa se sua esposa teve uma vida conjugal infernal. Pois a memória coletiva guarda apenas fragmentos, e no final, só importa o que você fez!
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Se o que importa na nossa vida são nossos atos, nossa vida não importa. Se os nossos atos são julgados depois de ocorridos, não importa o presente. Não somos nada no presente então, somos apenas o passado, o que passou, o que fizemos. Desse modo, temos que fazer coisas grandes, geniais para que possamos ser lembrados, seremos hoje o resultado de ontem.
Mas e o destino? O destino inexorável que nos empurra para determinados caminhos, que parece não nos dar escolha. O destino no futuro também não existe, ele está no passado. É no passado que vemos o destino, como uma força incontrolável que nos impulsionou para determinado lugar, quando nós poderíamos ter ido para outro, como um desígnio do destino, “tem que ser assim” (es muss sein).
Depois de acontecido o fato se torna obra do destino. Como se não fosse possível ter sido de outro modo.
É isso ai, por
Jan Träumer (Einmal ist Keinmal - política, literatura, poesia, direitos humanos, reflexões, 1968)
às
8:38 PM
Marcadores:
reflexões
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3 comentários:
Na real, me indentifiquei mt com esse teu post. Sempre concordei que estaremos sempre sozinhos, pq como vc mesmo disse, assim nascemos e assim vamos morrer. O q me faz crer cada vez mais na auto-suficiência. E ainda me lembra uma frase: "Tanta gente no mundo e eu continuo comigo mesmo", q a cantora Pitty disse certa vez. E vc falou sobre destinos... tbm acho q o destino no futuro não existe. Senão, q graça teria viver se já tá tudo planjeado? Seria melhor só se deixar levar pela corrente... Acho q o destino se torna uma resposta do passado. Afinal, tudo o q vc faz acaba voltando pra vc. Acho q é isso q norteia o futuro.
Bom Jan,fiquei muito reflexiva com esta leitura e me passou um turbilhão de histórias vivenciadas por mim.De como realmente passamos a vida toda buscando reconhecimento das pessoas nas quais compartilhamos nossa vida.Vivo numa constante trasnformação! Chega uma hora que me pergunto: quem sou eu? O que quero ser?Nossa bate uma neura louca.Mas depois relaxo pq essa teia de complexidade humana faz parte do crescimento humano.Já dizia José Saramago em seu Ensaio sobre a Cegueira: "Há dentro de nós uma coisa que não tem nome, essa coisa é o que somos".
É necessário que possamos viver bem com nós mesmo pois creio eu, se não estamos bem com nossas idéias e valores fica muito difícil o convívio com os nossos.
Da solidão citada por vc, acho que encaixa lembrar da estória dos "Buendias" de Cem Anos de Solidão de Gabriel Garcia Marques em que no final de tudo "morremos sós".
Um grande abraço caro colega de profissão.
Muito bom o seu texto. Somos realmente marcada por atos que cometemos. Não importa o que nos levou a cometê-lo, a vida torna-se fragmentos dependentes da boa intenção de quem relembrar. Dizem que no inferno está cheio de boas intenções!! Somos sim solitários, nascemos só e morreremos só. O destino é uma resposta do passado mas ter conciência desta realidade nos tira da inoscência da busca no outro.
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